Ela

Aquela pessoa que nunca parece estar ouvindo o que eu digo, pergunta direto o que eu acabei de falar e parece nunca gravar a maioria das coisas que digo. É a mesma pessoa que tem uma memoria infalível para o que contei  há 5 anos atras, ou mais, adora se vangloriar de lembrar todos os meus micos de criança e sempre sabe o que eu vou esquecer de carregar no dia-a-dia, celular, casaco ou documentos.

A primeira a debochar quando engordo, a primeira a perceber quando emagreço. Posso até tentar omitir ou esconder qualquer coisa dela, o máximo que acontece é ela fingir que acredita. Ri quando sou convencida, apoia quando sou resiliente, incentiva quando sou insegura, se ausenta quando sou silêncio, se envolve quando sou toda conversa. Identifica qualquer problema na mudança da alimentação e do humor.

Corre todos os dias, de manhã cedinho, por prazer, e se pá para emagrecer. Diz que come saladas e que não descuida da alimentação, eu contesto. Sempre subindo na balança, exorcizando meu caos, pelo menos tenta, procurando receitas diferentes e inventando. Seja na cozinha, na arrumação, no esporte, sempre improvisando. É espirituosa, debochada, pirracenta, competitiva, comprometida, esforçada.

Com mais de 50 anos, se deu de presente uma tatuagem, simbolo do seu prazer em correr. Adorei a atitude, incentivei muito, fui a vozinha que guiou, mas ela ficou satisfeita com resultado. E, se depender de mim, vai ter mais, e pelo visto vai ter mesmo. Acho que tem uma certa idade que não temos mais medo de escolher os símbolos que nos marcar, pois eles já se tornaram velhos conhecidos e as duvidas são menos constantes.

Minha mãe é dessas que abriu mão de tudo para cuidar das filhas. Diz que não se arrepende, mas que eu não faça isso! Abandonou o calor da Bahia pela esperança de educação e saúde com maior qualidade do sudeste. Criou duas crianças sem o apoio presente da família, limitações que a distancia impõe.

Sofre até hoje com os dias sem sol e com as noites geladas. Completamente ligada ao mar e a uma religiosidade mix de catolicismo, espiritismo e achismos. Me ensinou o poder é o prazer de se dizer sempre a verdade, coisa que aprendeu com a minha avó, se salvou de apanhar quando criança graças a verdade. Me ensinou a me fascinar com sol e mar.

É alegria, cores, bagunça e barulhos. Se obrigou a se tornar mais discreta pela frieza de minas e dos mineiros. Perdeu parte do sotaque, nas ferias que passamos por lá até recupera. Mas não perdeu a ginga e a capacidade de rodar a baiana quando necessário. Parece ser sempre mansa, quieta, aceitar e acatar tudo quanto for preciso. Até que se arreta! E ai… sai de perto!

Reclama do liquidificador para lavar, dos kimonos que demoram a secar. Mas deixa sempre tudo disponível quando precisamos. Fica perdida de manhã quando perco a hora e mal consegue me acordar. Sofre quando estamos com cara de final de semestre ou em qualquer momento que agitação fica em alta. Adora receber presente, atenção e elogios, mas ai, quem não né?

Agora que descobriu whatsapp e os joguinhos de celular, não é mais tão disponível assim. Se ela ler isso, estou encrencada. E pior, ganhou uma capacidade sem igual de respostar para tudo, aquele tal de “google” e não tem quem convença de chegar as fontes. Fiel compartilhadora de imagens com “bom dia”, avisos e piadas mesmo ao meu lado no sofá, lá esta a notificação de mensagem. Usa e abusa da tecnologia.

Disponibiliza seu guarda roupa, cosméticos, sapatos e o que for sempre que pode. Adora usar minhas coisas, pedir opinião, dar opinião, ainda que não tenha sido solicitada. Mãe é a figura mais figura, com medos infundados, preocupações inexplicadas mas todo o carinho e disposição para ajudar. Muita bronca, falação na cabeça e mais mimos, cuidados, doces, mimos. A medida certa de tudo, de um jeito que só mãe sabe.

 

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